Houve toda uma preparação para o ritual acontecer: tínhamos
que comer comidas leves durante o dia, o objeto de que gostávamos e que levamos
para viagem era para entregar de presente para o xamã e praticar o desapego, e
nesse dia, eu não ia poder ligar para meu namorado, porque não tinha hora para
voltar.
Mandei uma mensagem para ele dizendo que não ia poder ligar à
noite, ia fazer o ritual e não sabia a que horas iríamos voltar e que depois eu
explicava.
Para o presente do xamã, como tinha levado dois, escolhi o
que seria mais fácil de repor; ou seja, não pratiquei, de fato, o desapego.
No trajeto para o local de realização do ritual xamânico,
tivemos que trocar de ônibus – havia uma ponte, no meio do percurso, que não
suportaria o peso dele. Pegamos, então, um ônibus velho – a ponte era realmente
perigosa. Na ida, de dia, já achei complicado; imagina à noite! Já fiquei com
medo.
O lugar era lindo; quem conhece o Vale do Capão sabe do que
estou falando. O ritual aconteceria à noite, tínhamos que estar de roupa de
banho e consistia em entrar em uma cabana que só cabia todo mundo muito
apertadinho, e que também não tinha altura: ótimo para a minha claustrofobia! Depois,
aconteceriam alguns cantos e seriam colocadas pedras quentes, água e ervas no ambiente.
Foi chegando a hora do ritual. Previamente, ingerimos alguma
bebida e recebemos algumas instruções: deveríamos fazer um cumprimento à terra
falando “por todas as nossas relações” e entrar; se precisássemos sair,
teríamos que pedir permissão e fazer todo o processo novamente.
Fiquei no início da fila da primeira leva de quarenta
pessoas que iam entrar; tínhamos que apertar bem muito, estava de um jeito que
eu não tinha espaço dos lados e nem em cima e nem atrás, ouvi o xamã dizer que
estávamos entrando no útero da nossa mãe. Eu já estava me sentindo sufocada,
sem ar nenhum, e ele agora ia colocar uma segunda fila na minha frente; antes
mesmo que eu pudesse pensar, saí correndo da tenda!
Tive que esperar o povo todo até terminar o processo, o
lugar não tinha luz e estava muito frio, não conseguia achar minhas roupas. Não
foi fácil lidar com esses desconfortos do lado de fora também.
De cara, veio a memória de quando estava no útero da minha
mãe e que nasci laçada com duas voltas do cordão umbilical, completamente
sufocada; a minha claustrofobia, certamente, tinha a ver com o meu nascimento.
Ao mesmo tempo que fiquei intrigada quanto à descoberta da motivação
da minha claustrofobia, tive que lidar com a frustração de não ter conseguido
ficar no ritual, porque o medo foi maior que eu, porque tinha desistido; olha a
minha cobrança de novo, com gosto de gás!